Crônica - Jogos de Búzios - Manoel messias Pereira


Jogos de Búzios

Em 1955 no dia 3 de agosto nasci, e fui registrado com o nascimento no dia 16 de agosto deste ano. Portanto entre o fato do meu nascimento e o registro cartorário foram 13 dias de diferença. E sempre brinco que entre os calendários cristãos, gregoriano e juliano também há uma diferença de treze dias. Mas isto é apenas uma leve brincadeira.

Nasci num lar, de muita simplicidade. E ainda na minha infância vi minha mãe jogando os búzios sobre as mesa, num espaço mágico entre as guias que limitava o seu olhar. Ela falava  em Yorubá, procurando o Odu ou seja o destino na leitura de sua espiritualidade e  aos poucos ensinava-me, lições  para que pudesse aprender com  seus olhares, palavras e gestos o respeito por minha existência. E isto nunca nego. Se sou o que sou pela obra e graças de Deus, que me concedeu uma mulher como um anjo, que possibilitou -me os primeiros passos e a leitura de um mundo com constantes fragilidades.

Descobri logo cedo que como descendente de seres escravizados que foram os afros brasileiros no passado e por uma perversidade do próprio sistema capitalista, que usa de todas as formas para o domínio e a exploração de um ser humanos sobre o outro, num processo de desrespeito e de plena estupidez. Que este mundo havia preconceitos, discriminações, e o latente racismo.

E notei que era preciso atuar, que era preciso aprender muito mais para ensinar. Pois usando aqui de uma frase de Fernando Henrique Cardoso, que um dia disse "Não há conciliação entre a democracia com as sérias injustiças sociais e as suas formas variadas de exclusões e violações reiteradas de Direitos Humanos." E o racismo, a discriminação racial o processo de preconceito, é uma doença social em que as pessoas passam a ter um tratamento degradante do ponto de vista social. E não há como aceitar.

E desta forma o alicerce que plantei o meu olhar sobre a realidade, foi o de vencer aos constrangimentos que a estrutura sócio-politica capitalista colocou ao meu povo. Como disse o autor Jorge Silva, no livro "trabalhando a diversidade organizado por Arno Vogel "Não há como avançar sem vencer os constrangimentos" E com isto observo que neste tipo de sociedade em que cada um vale pelo que ele tem de bens materiais, foi preciso apoiar as iniciativas estruturais do sistema de cotas garantindo assim um melhor rendimento pra enfrentar a naturalização do racismo. Pois até pessoas de boa fé de ótima índole convive com o preconceito, com o racismo com o constrangimento legal e não percebe o quanto de fútil e improdutivo e o  que este mesquinho sentimento estabelece enquanto ação nefasta na vida.

O processo pela qual lutamos nesta adversidade de preconceito e exploração, que limita-se em todos os campos da atividade humana, tem como agente nocivo  uma sociedade socialmente enferma e que necessita sim do nosso auxílio. Daí a importância em São José do Rio Preto-SP, do Conselho Afro, do Nerp - Núcleo de Enfrentamento ao Racismo,  da Secretaria da Mulher, Raça e Etnias e Pessoas com Deficiências, e nas mãos de pessoas como Eni Fernandes, Luana Passos, entre outros colaboradores para que as coisas caminhem dentro de uma perspectiva que possa de fato e de direito corresponder as necessidades desta sociedade. E isto estamos dizendo pois quando procuramos uma autoridade competente para resolução de um problema fora destes marcos que aqui presenciamos precisamos além de levar a reclamação também a exposição da lei, uma vez que há delegados ou agentes públicos, que agem como se desconhecessem Lei, num desrespeito total a nossa Constituição da República Federativa do Brasil, e as Leis Ordinárias  que regulamenta-a como a Lei Caô, entre outras. Sabemos da ternura que mantemos pelo respeito e lisura a todas as convenções mas nem sempre só de amor vivem a humanidade é preciso a ética, fazer o que estiver pra ser feito.

Estas são as lições que assimilei de quem partiu a seis meses para o ORUN. E aqui estou com meu destino, repeitando meu Legba como se minha casa fosse uma corte celeste mas mantendo sempre de olhos vivos aguerridos sobre as ruas e as encruzilhadas por qual passo. Os caminhos por onde andamos merecem ser respeitados sempre. E quando falo isto parece que vejo minha mãe jogando os búzios sobre a mesa limitando o olhar sobre os colares, contas e guias.



Manoel Messias Pereira

professor, poeta, cronista
membro da Academia de Letras do Brasil - ALB
São José do Rio Preto -SP. 








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